Política legislativa, qualidade das leis e simplificação da comunicação
Abstract
A qualidade das leis é uma exigência de cidadania que surge cada vez mais no centro das preocupações dos poderes públicos e da sociedade em geral. Esta exigência constitui, em termos de policy making, um desafio complexo. Há que encontrar respostas adequadas para múltiplas questões de âmbito jurídico, em sentido estrito, nos planos organizativo, material e formal: a pertinência das leis, a racionalidade do processo legislativo, os modelos de concentração legislativa. Mas está também em causa algo de essencial do ponto vista democrático: a eficácia da comunicação. Os actos normativos são, necessariamente, actos de comunicação que não têm apenas como destinatários aqueles que, dum ponto de vista formal, são chamados a aplicá-los, ou seja, os grupos profissionais reconhecidos oficialmente como operadores do direito no plano administrativo e judicial, e aqueles cujos comportamentos pretendem, em última instância, orientar ou determinar. Estamos perante um processo de comunicação multi-direccional, em que as normas jurídicas são objecto duma mediação social diversificada, cuja eficácia contribuirá para uma maior ou menor aproximação da prática ao modelo ideal definido como Estado de direito. A tomada de consciência relativamente a esta dimensão da produção normativa está na origem de várias iniciativas para promoção da chamada "linguagem clara" (plain language) nos textos legais. Em Portugal, a política legislativa conheceu um importante salto qualitativo com o aparecimento, em 2006, do programa Legislar Melhor, que surge em linha com as recomendações da União Europeia e de organizações internacionais a que Portugal está associado no âmbito das iniciativas da chamada Better Regulation e pela primeira vez equacionou duma forma integrada o conjunto de problemas que se colocam neste domínio. Na sequência desta iniciativa foi apresentado, já em 2010, o programa de Simplificação Legislativa - SIMPLEGIS, que apresenta três objectivos fundamentais: simplificar a legislação, facilitar o acesso dos destinatários ao seu conteúdo e melhorar a aplicação das normas. É naturalmente cedo para proceder a qualquer avaliação do programa, anunciado há poucos meses. Parece evidente, em todo o caso, que com ele a política legislativa entra em Portugal numa nova fase. A consciência de que as leis pressupõem um processo de comunicação com os cidadãos a que se dirigem está muito presente no conjunto de medidas tomadas, que visam a produção daquilo a que podemos chamar "leis próximas dos cidadãos" ou "leis amigas dos cidadãos". A presente comunicação equaciona algumas questões teóricas e práticas levantadas pela simplificação legislativa e procede a uma análise da situação actual da política legislativa em Portugal.