Democratização, descentralização e os desafios da governança local: a experiência brasileira contemporânea?

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Date
2011Author
Carneiro, Ricardo
Brasil, Flávia de Paula Duque
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Dentre as questões colocadas em evidência no âmbito do debate em torno da reforma do Estado, a descentralização aparece como um ponto central, compondo a agenda reformista de ampla gama de países. A América Latina assume destaque nesse contexto, tendo experimentado, a partir dos anos finais do século passado, um processo intenso de descentralização, o que se faz em estreita articulação com a redemocratização da vida política. O Brasil não apenas segue a tendência dos países latinoamericanos, mas a radicaliza, tendo em vista a consagração do município como ente federado, por força da nova Constituição Federal, promulgada em 1988. Desde meados dos anos 1990, o país assiste a avanços expressivos na direção da ampliação do papel das municipalidades na provisão de serviços à população, em consonância com os princípios descentralizantes do novo texto constitucional. Trata-se de um movimento impulsionado pelo governo federal e que é movido, em larga medida, por preocupações de natureza macroeconômica, relacionadas ao ajuste fiscal como requisito para a estabilidade monetária. Como resultado do processo, a prestação atual de serviços básicos nas áreas de saúde, saneamento, educação fundamental, habitação, infra-estrutura urbana e assistência social, dentre outros, tem sido realizada de forma dominante pelos governos locais, a despeito da enorme disparidade em termos de capacidade administrativa entre os mais de 5 mil municípios que compõem a nação brasileira. Isto coloca em relevo tanto as exigências de profissionalização da administração pública, com o intuito de melhorar a entrega de serviços à população, quanto a necessidade de criar formas institucionalizadas de participação da sociedade nos assuntos públicos de conotação local. Nesse cenário, o artigo discute a importância da profissionalização dos aparatos administrativos das municipalidades brasileiras, as quais se defrontam com o desafio não apenas de prover uma gama ampliada de serviços públicos, mas de sua provisão mais calibrada com as necessidades e aspirações das comunidades locais. O argumento desenvolvido procura mostrar que, a despeito de avanços no tocante ao desenho de instrumentos de planejamento e gestão à disposição das administrações municipais, a ausência de uma estrutura administrativa do tipo weberiana, especializada e profissionalizada, deixa espaço aberto para a adoção de práticas clientelistas e patrimonialistas, lesivas ao interesse público. Isto coloca em relevo a importância de explorar as potencialidades associadas ao intercâmbio de experiências e idéias com os atores organizados da sociedade civil, consoante as premissas de democratização da atividade governativa. Avançar nessa direção, por sua vez, requer um comprometimento mais efetivo, tanto dos governantes quanto da sociedade, com relação às instâncias de participação de âmbito local, para além do mero formalismo de sua criação, sem o qual a descentralização pode se configurar como um salto no escuro.