Federalismo e relações intergovernamentais: os consórcios públicos como instrumento de cooperação federativa
Resumo
Se nos Estados federais os mecanismos de cooperação e coordenação intergovernamental já são relevantes, eles ganham centralidade ainda maior no caso brasileiro. A Constituição da República de 1988 agregou complexidade ao desenho federativo brasileiro, reconhecendo o Município como ente federado. Esse processo foi acompanhado por uma intensa descentralização de políticas públicas, pelo fortalecimento do poder local e por mecanismos pouco coordenados de relação vertical e horizontal entre os entes federativos. Ao mesmo tempo, a ausência de políticas de desenvolvimento regional acentuou as desigualdades locais/regionais observadas historicamente no país. Diferentes experiências de consorciamento foram levadas a cabo por Municípios no país e ainda hoje este é um instrumento de larga utilização. De forma diversa, as iniciativas de cooperação entre Estados são ainda incipientes. As limitações institucionais e jurídicas dos desenhos utilizados pelos Municípios, no entanto, levaram à aprovação de uma Emenda Constitucional n§ 19/98, que instituiu os consórcios públicos e a gestão associada de serviços públicos. Com o objetivo de contribuir para completar o desenho federativo brasileiro e disponibilizar um instrumento de cooperação intergovernamental, o Governo Federal enviou projeto ao Congresso Nacional com vistas a criar um ambiente normativo mais favorável à aplicação do artigo 241 da Constituição da República, instituído por meio da Emenda Constitucional n. 19 de 1998. Tal ambiente normativo favorável trata-se de afastar algumas das dificuldades que a legislação federal impõe no estabelecimento de obrigações entre entes da federação, uma vez que, no sistema federal brasileiro, cabe à União fixar as normas gerais de todos os contratos celebrados por entes que integram a Administração Pública de qualquer dos entes da federação. A elaboração do projeto de lei não foi livre de polêmicas. O grande consenso em torno do seu mérito constituinte, no entanto, faz com que seja grande a expectativa de que tal instrumento possa ser rapidamente aprovado e, por meio dele, seja possibilitada a constituição de instrumentos de cooperação federativa adequados a diferentes escalas territoriais e a múltiplos objetivos, assim como seja superada a insegurança jurídica dos arranjos de cooperação que os entes públicos hoje utilizam. O efetivo uso dos consórcios públicos e da gestão associada de serviços, no nosso entendimento, pode ser um instrumento poderoso para o enfrentamento da nova agenda federativa, em especial a agenda das cidades e do desenvolvimento regional.