Reestruturação produtiva e políticas redistributivas: a experiência do microcrédito no município de São Paulo
Resumen
O objetivo deste artigo é analisar o atual programa de microcrédito do município de São Paulo, o "São Paulo Confia", face ao processo de reestruturação da atividade produtiva decorrente da abertura comercial. Será mostrado que o programa de microcrédito, que até 2000 não atingia o município de São Paulo, é fundamental para permitir melhorias de bem-estar da população excluída do mercado formal de trabalho, seja por qualificação seja por idade. Até os dias atuais, o município de São Paulo é conhecido como o mais rico do país, representando o quinto maior orçamento público do Brasil. É também o mais populoso, com mais de dez milhões de habitantes. Boa parte dessas características foi decorrente do processo de desenvolvimento econômico brasileiro no século vinte, principalmente na sua segunda metade. O Processo de Substituição de Importações delineou a estratégia brasileira de desenvolvimento e o município de São Paulo foi um dos grandes beneficiários. A localização da indústria próxima ao mercado consumidor e posteriormente os efeitos de encadeamento e causalidade circular tornaram o município paulistano o grande pólo industrial e de negócios da América do Sul. Sua população crescia ao ritmo da expansão industrial, pois atraia migrantes das diversas regiões do país que buscavam maiores salários e melhores condições de vida. Esse grande movimento produtivo e populacional, no entanto, deu-se num curto espaço de tempo, de modo que a infra-estrutura urbana (habitação, saneamento, pavimentação, escolas e hospitais) foi aquém do necessário, criando-se bolsões de pobreza e exclusão nas regiões periféricas do município. Esse problema viu-se agravado com dois fatores: a redução do ritmo de crescimento econômico do país ao longo das décadas de oitenta e noventa e o processo de reestruturação produtiva iniciado a partir da abertura comercial em 1990. A abertura comercial trouxe consigo a ruptura das cadeias produtivas consolidadas, a extinção de empresas ineficientes e o correspondente aumento das importações. Por outro lado, abriu possibilidades para explorar vantagens comparativas e competitivas de outras regiões e negócios, não necessariamente atrelados ao mercado interno como outrora. Como o município de São Paulo foi o grande beneficiário do Processo de Substituição de Importações, no contexto da Abertura Comercial é o que mais se onera. Boa parte das empresas industriais instaladas encerra suas atividades ou muda-se para regiões do interior, fora da área metropolitana. O estoque de problemas herdados da fase de rápido crescimento econômico vê-se agravado com as condições adversas de geração de emprego e renda face à reestruturação produtiva. Cada vez mais o município de São Paulo vai se tornando uma cidade de serviços e cuja demanda por mão-de-obra exige maior qualificação. Dessa forma, graças às imperfeições do mercado de trabalho e do mercado de crédito, os habitantes da periferia de São Paulo vêem-se numa situação complexa no que tange às suas possibilidade de geração de renda e de emprego, tornando a exclusão social longe da ruptura. Este é o paradoxo do município mais rico do Brasil e ao mesmo tempo um dos mais desiguais. Dificilmente as políticas públicas redistributivas implantadas nos últimos oito anos atentavam para esse paradoxo e excluíam o município de São Paulo dos programas de renda mínima e microcrédito. Para fazer esta análise, o artigo será composto de quatro partes. A primeira fará uma descrição do processo histórico de desenvolvimento econômico na segunda metade do século vinte enfocando o caso do município de São Paulo. A segunda parte, por sua vez, apresentará fundamentos teóricos para explicar o processo de aglomeração e de posterior desconcentração da atividade produtiva. Já a terceira parte apresentará evidências empíricas do atual processo de desconcentração face à abertura comercial e da questão da exclusão social nas áreas periféricas do município. A quarta parte, por fim, mostrará as características do programa municipal de microcrédito, a "Central de Crédito Popular São Paulo Confia".