Sistemas de informação como instrumentos de operacionalização de acordos de integração regional em contratações públicas

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Date
2011Author
Moreira, Carlos Henrique de Azevedo
Carneiro De Filippo, Francisco
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A integração Regional Sul-Americana é um dos objetivos mais estratégicos na política externa brasileira e também da grande maioria dos países do continente. O processo de integração remonta a criação da Associação Latina Americana de Integração (ALADI), onde se depositam todos os acordos comerciais e de complementação econômica da América Latina, bem como, desde aquela época, se criou as bases do Regime de Preferências Comerciais, até hoje fundamentais na região. Ademais, consolidaram-se no continente o Mercosul e a Comunidade Andina (CAN) como acordos que visam uma integração para além dos aspectos tarifários, ganhando referência política, econômica e comercial. Por seu turno, a ALBA e, mais recentemente, a UNASUL buscam expandir a integração a partir da cooperação técnica e política, sendo esta última, a grande aposta para a unidade de todo o Continente sul-americano. Do ponto de vista do financiamento do desenvolvimento e da integração, também existem importantes instrumentos capazes de induzir um processo conjunto por parte dos países da América do Sul: BID, CAF, Fonplata e mais recentemente o próprio FOCEM apresentam-se com um leque variado de instrumentos e possibilidades de recursos destinados a ações internas nos países da região, mas também de apoio à integração física, tal como consolidado no programa da Iniciativa para a Integração da Infra-estrutura Regional Sul Americano (IIRSA). A existência de uma Câmara de Liquidação financeira, como o Convênio de Créditos Recíprocos (CCR) garante agilidade e confiança em muitos dos negócios entre os países. Não obstante todos estes aspectos e avanços, todos reconhecem que o caminho para a integração sul-americana tem muito a se desenvolver. Neste sentido o Mercosul aprovou, em dezembro de 2010, a Resolução GMC 56 que estabelece tarefas e cronogramas de ações no sentido de avançar rumo ao estabelecimento, de fato, de uma União Aduaneira. Estes fatos permitiram um crescente desenvolvimento da formulação estratégica envolvendo o tema de Compras Governamentais: o desenvolvimento tecnológico e o crescente peso das políticas de investimento e gasto público. Neste último aspecto, a experiência exitosa no Brasil no estímulo às micro-empresas e empresas de pequeno porte -MEEPP, oportunizada pela Lei 123/2010 (Estatuto da Micro e Pequena Empresa), comprovou a importância das políticas de uso do poder de compra, ao trazer benefícios específicos a este segmento, praticamente dobrando a participação das MEEPP nas compras governamentais, passando de uma média de dezesseis por cento na primeira metade da década passada para 29% na segunda metade, com reflexos positivos na geração de postos de trabalho. Associando estes dois grandes fatores: papel crescente do investimento público brasileiro e caráter evolutivo da base legal do sistema de Compras Governamentais, chegamos à conclusão sobre a sensibilidade e responsabilidade inerente a possíveis acordos internacionais envolvendo o tema de Compras Governamentais. Uma negociação em Compras Governamentais parte dos três princípios básicos de uma negociação comercial. O primeiro passo é a consolidação do status quo da legislação, ou seja, a garantia de que princípios ou mesmo as regras normativas adotadas não serão alteradas no sentido de se tornarem mais restritivas ao exterior. Numa negociação comercial típica, esta consolidação se traduz em tetos para as tarifas. Num acordo de Compras governamentais, este primeiro passo é chamado de transparência, ou seja, a explicitação das normas e procedimentos para a participação de estrangeiros no processo licitatório. Um acordo de transparência de princípios normativos é bastante tranqüilo para o Brasil, uma vez que toda a legislação brasileira deve seguir os princípios mais relevantes ligados a transparência, isonomia, impessoalidade, igualdade, legalidade, julgamento objetivo, dentre outros. O segundo estágio de negociação envolve o debate de acesso a mercados, sendo que este se pode desenvolver no regime de preferências nas licitações internacionais frente a terceiros países ou na garantia do tratamento nacional. Em alguns casos, para países com múltiplos acordos, muitas das vezes ocorre a mistura de ambos. No caso do tratamento nacional, a primeira reivindicação é de que empresas estrangeiras instaladas num país tenham o mesmo direito das empresas nacionais, o que no caso brasileiro já é garantido pela Emenda Constitucional 06 de 1995. O segundo passo é fornecer às empresas sediadas no outro país signatário do acordo o direito de participar das licitações nacionais. Neste último caso, é fundamental a vinculação do processo de compras com os regimes de verificação de origem, para evitar que terceiros países se utilizem do benefício de um acordo de compras. Ou seja, se um importador brasileiro hoje pode participar de uma licitação nacional, tal fato não pode ser extensivo aos importadores de outros países signatários, uma vez que permitiria facilmente o processo de "triangulação" de produtos. A terceira e última etapa do processo negociador envolve os patamares a partir do qual valem as regras e princípios acordados, as listas de entidades, bens, serviços e obras públicas envolvidas, bem como as notas gerais, onde cada país fará suas ressalvas específicas. Nas Notas Gerais, ao se excetuar os principais programas adotados por um país fica explícito a importância de compras governamentais como instrumento de política pública. Todavia, em casos como o do Brasil e, porque não, de toda a América do Sul, com o crescimento do ciclo de investimentos e base legal ainda em evolução, um acordo de trato nacional que impeça a distinção entre empresas dos países, ou em transparências envolvendo regras rígidas tende a travar o grande e importante avanço que ocorre. Assim, a posição "defensiva" do Brasil nas negociações envolvendo Compras Governamentais é um mandato importante que calibra o interesse de expansão comercial com o desenvolvimento legal das políticas públicas. Se a postura mais defensiva é uma estratégia importante para acordos com países e regiões mais distantes, distinta é a leitura brasileira para o caso do Mercosul. Afinal, o interesse estratégico da integração passa por construir, assim como em outras áreas, processos e políticas de uso do poder de compras semelhantes, bem como fortalecer a integração produtiva e tecnológica na região. Assim, é por esta leitura mais geral da integração, que o simples fato da existência de um acordo de compras no Mercosul, para o Brasil já traz ganhos e externalidades positivas para além dos laços comerciais. Dadas as regras de equalização para garantia dos interesses dos países membros, o passo seguinte é a construção de um sistema de informações que possibilite o compartilhamento de um conjunto de informações que viabilizarão o estabelecimento de um diálogo comum. Na base deste sistema está o cadastro de fornecedores e os catálogos de materiais, serviços e obras, cujos requisitos devem harmonizar os aspectos de interesse comum aos países membros e, também, permitir que cada qual possa utilizar estas informações em seus sistemas próprios, complementando-as de acordo com suas necessidades. Estes cadastros criam uma linguagem comum que facilita o compartilhamento de oportunidades e a criação de um referencial único para as compras governamentais. O Cadastro de Fornecedores tem por finalidade concentrar as informações dos empreiteiros de obras públicas, fornecedores de bens e prestadores de serviços, tanto dos elegíveis como daqueles declarados como impedidos a participar nos concursos realizados pelos países membros. Já os catálogos de Materiais, Serviços e Obras padronizam a descrição dos objetos a serem contratados, de acordo com as boas práticas de mercado, visando apoiar os compradores, evitar direcionamentos e possibilitar a comparação futura de preços. No presente artigo defende-se a idéia de que a construção e implantação imediata de sistemas informatizados para apoio a esses cadastros, os quais podem contribuir para uma melhor compreensão dos impactos nas economias dos países membros e acelerar o processo de integração regional.